Especial Pós-Enchente
05 de maio de 2014 | Governo do Estado de Rondônia
Para se chegar ao distrito de Fortaleza do Abunã, a palavra que se pode usar é aventura. Da BR-364 até a sede do distrito, cerca de 10 km em estrada de chão, já bastante empoeirados e que dificulta a visibilidade devido o tráfego intenso de caminhões em busca de pedras brita, devido uma pedreira na localidade.
E foi esta pedreira que salvou a população do isolamento total pois para manter o tráfego de caminhões, o proprietário, com auxílio do Departamento de Estradas e Rodagens (DER), levantaram o leito da estrada com aterro e pedras para manter o fluxo de veículos.
Segundo Caio Fernando de Sousa, gerente de expedição e recebimento de materiais da Pedreira Fortaleza, foram dias difíceis pois “quando se conseguia erguer a estrada pela manhã, à tarde a água já tapava a estrada de novo”. Segundo ele, em alguns pontos, o aterro chegou a ter quase três metros de altura, “e mesmo assim a água passou por cima”.
Os trabalhos foram em conjunto entre a empresa que ofereceu alojamento, alimentação e até combustível para que o DER auxiliasse nesta demanda. Agora, segundo o gerente, será feito um estudo de viabilidade para saber “se vão aproveitar o que foi feito e vão alargar mais a pista”.
Carretas não entram até a sede da empresa pelo risco que oferece a pista estreita e também devido à fiação da energia que passa sobre a pista que agora ficou muito baixa. Com isso, a pedreira fez um depósito em uma região mais alta, onde as carretas maiores são carregas com pedras.
Alagamento
Logo após a pedreira, fica a sede do distrito de Fortaleza do Abunã, muito conhecido na região pelas belas praias que se formam com a baixa do rio, atraindo muitos turistas de Porto Velho e Rio Branco, que possuem casas de veraneio na localidade.
Mas belezas naturais não foi o que se viu. Para se chegar a sede da localidade, um alagamento na estrada ainda impede a passagem com locais onde a água ultrapassa um metro. Com esta dificuldade, um morador abriu uma picada no mato para poder dar acesso terrestre. Além de estreito, o desvio apresenta muitos buracos e riscos de atolar, se o carro não for alto e traçado.
Quando se entra na sede do distrito, já se consegue ver o rastro de destruição que as águas do rio Abunã deixaram para trás. A escola Barão do Rio Branco e a quadra de esportes, foram tomadas por 1,5 m de água pelo que se percebe das marcas nas paredes. As aulas continuam suspensas e por informação dos moradores deverão ser retomadas no próximo dia 5. Mas não se via movimento algum nas suas dependências que indique algo.
A dona Vitória da Silva Rodrigues, 77 anos, que está com sua casa parcialmente inundada ainda, diz ter presenciado a cheia de 49 e diz nunca ter visto algo parecido. Seu filho que tinha a casa nos fundos da mãe, teve sua casa totalmente encoberta pela água e destruída pelo rio Abunã.
“É muito triste, muito triste… a gente fica olhando e medindo os centímetros e esta água não baixa”. Segundo ela, “para subir foi muito rápido”. Gesticulando mostra no corpo “de manhã estava aqui (mostrando a região dos pés) e à tarde já estava aqui (peito)”.
Dificuldades
Ao chegar ao mirante à beira rio, o sentimento é de desolação. A cidade parece deserta. O que ouve é silêncio total, só quebrado por uma ou outra voadeira que chega trazendo um morador de algum sítio localizado nas proximidades.
Segundo o pescador Abdon Ferreira da Silva, na área do mirante a “altura da água está hoje (29), em cerca de 10 metros. Mas chegou em 14 ou 15”, disse. Algo que se constata pelas marcas deixadas nos muros das residências. Segundo ele, a Defesa Civil trouxe muita cesta básica que chegou de helicóptero na localidade.
Ele é proprietário de um sítio na região que ficou totalmente alagado. Segundo ele, parte foi indenizado pela usina, mas “tem uma parte que a usina não quer pagar, mas agora alagou tudo. O advogado está vendo isso. Acho que vão ter de indenizar, né?”
A população se abastece de água para poder beber fornecida pela pedreira. Mas segundo a moradora Maria da Penha Alves, “a gente tem que ir lá buscar. E não é fácil chegar até lá”. Para os demais serviços da casa, os moradores utilizam a água do rio.
Maria da Penha e outros moradores, reclamam muito da Eletrobras Rondônia por cobranças abusivas nas contas. Segundo ela, que é proprietária de um bar à beira rio, afetado pela enchente, a energia foi cortada dia 11 de fevereiro, mas as contas continuam chegando.
Segundo ela, em março “recebi uma conta de cerca de R$ 233,00 e em abril de R$ 361,71. E a energia cortada. Como explicar isso?” Para a moradora, o pior foi procurar em Ponta do Abunã o responsável pela Eletrobras que disse que não podia fazer nada. “a gente fica revoltada né, pois não tem ninguém fazendo a medição, mas as contas chegam”.
Outro grave problema da região é a comunicação. Os telefones públicos não funcionam, “Se você pegar um telefone daqueles e ele funcionar, você acertou na loteria”, diz em tom de desafio a moradora Antonia Rocha Sena. “É igual”, diz ela “a taxa de telefone para quem tem em sua residência. A cobrança chega, mas o serviço não tem”.
A maior parte dos moradores da localidade vivem da pesca. O senhor João Ernani Alves Sales, é um deles. E reclama que devido a cheia, o período do defeso foi aumentado e segundo ele, foi dito que seria prorrogado por mais três meses, além dos quatro pagamentos normais. “Só que pra nós não foi pago esta prorrogação”.
Ele reclama também por ter vendido o peixe que possuía por um preço muito abaixo do praticado no mercado devido a cheia que estava atingindo sua residência e ele possuía dois freezers cheios e poderia perder tudo. “Tive de vender jatuarana por R$ 5,00 o quilo limpa para não perder tudo”.
Solidariedade
Mas segundo as duas moradoras, foi nesta tragédia da enchente que se conheceu quem realmente é amigo e quem não é. O espírito de solidariedade foi muito grande na cidade, disse Antonia. “Era bonito de ver”, disse. “Se uma casa estava alagando, na hora aparecia dez pessoas para ajudar a mudar móveis, tirar das casas, levar para outro lugar”.
Segundo Antonia, vários proprietários de imóveis que são de Rio branco, “ligavam e mandavam abrir a casa e alojar quem não tinha pra onde ir”. Um proprietário de uma pousada, “abriu as portas e recebeu várias famílias lá. Muitos ainda estão por lá”.
E este espírito solidário perdurou por longos dias de espera no baixar das águas. E continua até hoje, diz Antonia. Apontando para a rua comenta dos cachorros e gatos abandonados. “Só eu adotei uns oito, além dos cinco que eu tinha”, disse, complementando, afirmou “onde comem cinco, comem dez, não é mesmo?”.
Fonte
Texto: Geovani Berno
Fotos: Ésio Mendes
Secom - Governo de Rondônia
Categorias
Infraestrutura, Serviço, Transporte